Drops da Sétima Arte

Por Larissa Mendes

 

Garota Exemplar (Gone Girl). EUA. 2014.

 

Garota Exemplar

 

‘Quando penso em minha esposa, eu sempre penso na cabeça dela.
Me imagino abrindo seu lindo crânio e desenrolando o cérebro na tentativa
de obter respostas para questões básicas de qualquer casamento:
“No que você está pensando?”
“Como está se sentindo?”
“O que fizemos um ao outro?”’.
(Nick Dunne)

 

David Fincher sabe como ninguém dissecar o que há de mais sórdido no ser humano, que o diga Seven – Os Sete Crimes Capitais (1995), um de seus filmes mais impactantes. Em Garota Exemplar, seu décimo longa-metragem, o cineasta explora a vaidade, o cinismo e a superficialidade da instituição casamento: você entra em um relacionamento tentando fugir de todos os clichês convencionais e no final, encontra-se soterrado por sua própria ruína com alguma dose de exagero, é claro. Para acompanhar a complexa temática matrimonial, o thriller é pontuado cadenciadamente e apresenta um clima de tensão constante, além de uma pitada de sarcasmo. Embora o ritmo de sua primeira parte seja um pouco mais lento, o desenvolvimento do enredo e a apresentação dos protagonistas não ficam comprometidos.

A garota em questão é Amy Elliot Dunne (Rosamund Pike), bem-sucedida escritora de livros infanto-juvenis que narram as aventuras de Amazing Amy, seu alter ego teen. Jovem, rica e bonita, é bem verdade que no momento ela é uma frustrada dona de casa, que mudou-se para Cape Girardeau, no Missouri, para cuidar da sogra doente. O marido Nick (Ben Affleck), fracassado no ofício da escrita, é sócio do The Bar juntamente com a irmã Margo (Carrie Coon). A vida dos Dunne muda radicalmente quando Amy desaparece em suas bodas de cinco anos de casamento e as suspeitas recaem sob Nick. E qualquer coisa que se diga além disso é passível de spoiller, capaz de estragar as reviravoltas que a trama apresenta, incluindo a crítica sobre a televisão, o sensacionalismo midiático e a manipulação da opinião pública diante de um crime ou sequestro.

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Nick (Ben Affleck) na coletiva sobre o desaparecimento de Amy (Rosamund Pike) / Foto: divulgação

 

Apesar da tradução em português soar como título de comédia – é uma pena que Procura-se Amy (1997), de Kevin Smith, já tenha se apropriado de um nome mais oportuno –, Garota Exemplar é um suspense de primeira grandeza que figura entre as listas de melhores do ano e recebeu quatro indicações (Melhor Atriz, Diretor, Roteiro e Trilha Sonora) ao Globo de Ouro, porém não faturou nenhuma estatueta. As duas horas e meia de projeção garantem bons diálogos e personagens não-lineares – marca registrada do cinema de Fincher – vividos com maestria por Rosamund Pike (sua aura “Emily Thorne” está impecável; não por acaso acaba de ser nomeada ao Oscar 2015 como Melhor Atriz, aliás, única indicação do filme na premiação) e Ben Affleck (o papel de marido apático lhe caiu como luva). A propósito, a edição é outro ponto de destaque: a trama é alternada entre o nebuloso presente de Nick, utilizando uma paleta de cores sombrias e um flashback da vida de Amy (fundamentado em seu diário e narrado em off), em tons mais claros.

Baseado no livro homônimo da jornalista americana Gillian Flynn – que também assina o roteiro –, Garota Exemplar é conduzido com a mesma destreza de quem filmou clássicos como Clube da Luta (1999), O Curioso Caso de Benjamin Button (2008), A Rede Social (2010) e Os Homens Que Não Amavam as Mulheres (2011), todos adaptações literárias. David Fincher continua em grande forma, seja na produção executiva de House of Cards – série de grande sucesso no Netflix, protagonizada por Kevin Spacey –, flertando em outros formatos de mídia ou na velha e boa direção da sétima arte.

 

Larissa Mendes não é uma garota fantástica, tampouco exemplar.

 

 

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1 comentário

  1. Excelente resenha e ótimo filme!

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