Gramofone

Por Fabrício Brandão

 

MUNDO LIVRE S.A. – NOVAS LENDAS DA ETNIA TOSHI BABAA


 

Depois de alguns anos sem gravar, eis que os pernambucanos do Mundo Livre S.A. atacam de novo e intensamente. Com uma pegada que mistura letras irreverentes e bem dosadas de críticas voltadas aos efeitos míopes de nossos tempos, a trupe comandada por Fred Zeroquatro não se cansa de ser afirmativa naquilo que melhor sabe fazer: construir um caminho próprio e eivado daquilo que acredita ser o fundamental. Diga-se de passagem, o próprio Fred, que assina todas as letras do novo álbum, acaba por consolidar uma estética que vem se desenhando ao longo da trajetória do grupo, verdadeira teia de ideias a torpedear sentidos necessários ao tresloucado mundo que nos cerca.

Sem dúvida alguma, o que mais chama atenção no trabalho da banda são os elementos construtores do discurso. É como se, a cada disco, um capítulo de um extenso livro fosse escrito de forma pungente e continuada. Novas Lendas da Etnia Toshi Babaa é apenas um pretexto para deixar correr solto um universo paralelo de coisas que explodem aos quatro cantos do mundo. O nome, por si só, encerra um vasto painel pictórico de possibilidades e mexe bem com os brios da famigerada contemporaneidade. Aqui, vale também ressaltar a expressividade da arte de Derlon Almeida exposta na capa do cd.

Despaginando cada trecho dessa história agora contada, uma profusão de temas flutua nas mais variadas dimensões sonoras presentes no álbum. E exemplos dessa miríade de sensações não faltam. Há espaço para um vigoroso sentimento urbano nos apelos de Constelação Carinhoca 7324, faixa que também devota as atenções para a consciência ecológica. Noutro ponto, Se Eu Tivesse Fé – Fucking Shit vai fundo na racionalidade para questionar enlaces religiosos. Em Soneto do Envelhecido sem Pretexto, a sensação maior fica por conta de uma verve poética devidamente entonada sob a forma de um lúcido clamor. Uma controvertida negação à solidão se faz presente em Nenhum Cristão na Via Láctea.

Com 25 anos percorridos, a Mundo Livre S.A. não economiza nos arranjos de seu mais novo rebento e põe sua sonoridade a toda prova. Mesclando com precisão música e conteúdo, a banda mostra que os caminhos permanecem abertos a outros tantos arremates. O apelo lendário encerrado no nome de batismo do disco é valioso propósito para deslocar o foco em torno da escamoteada realidade em que pactuamos viver. Resta-nos a percepção do rumo das coisas, antes que o vento se encarregue de espalhar desavisadamente as páginas que mal sabemos escrever.

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