Janela Poética I

Mariana L.

 

Suzana Latini

Foto: Suzana Latini

 

DE VOLTA DE SI

 

Eis que aqui de volta
de mim e de si, e os dois já dizem:
(eu)
por onde e longe pari,
uma consciência
de sumidouro
ciência de construir o artefato
– a óbvia arte do inexato –
que exaure a hora em aura
(tão calma!)
do Existir.

 

 

 

***

 

 

 

A MAIS ATADA À TUA PALAVRA

 

Presa dela
Garras que cortam, ventando,
Tua palavra é meu interno labirinto
Onde as sílabas
Sonâmbulas
Implodem, balsas no porto do pesadelo.
Que me doeria mais o passo que tua palavra?
Ora, sabes que sim…
Mas a ideia tão deslizante que em um “nós” é tornada
Retoma a luz do que fora dito:
Aquela luz
Lembra-a para mim, ah,
Como no princípio, em que o Verbo erra!

 

 

 

***

 

 
LUZ DE ESPERA

 

A sala era imensa
E se estendia pela avenida
Onde luzes debruçadas nas calçadas
Moviam-se pela insônia indiscreta do crepúsculo.

O último homem da terra nesse instante
Sorriu para um pretenso deus morto
E o sol se desvestiu de luz
Buscando
Perdida já qualquer possibilidade de lirismo
sua última sílaba de vida.
(Passando de o Beco de Ávila, Tijuca, jan, 2015).

 

 

 

***

 

 

 

CANTO DE VISÃO

 

p/ a poeta máxima Else Lasker-Schüler

 

A voz, mais do que o olhar,
É que é o espelho da alma.

Por isso me calo
Frente ao mundo errático:
Deixo-o soar, enfático
E com meu único existir – sináptico –
Eu Fico.

 

 

 

***

 

 

 

SOUSANDANÇACRUZ

 

Clara, clara, mas de pulsar mortal,
Fria-se o que me dói em tua morte, sem violência
Que a essência é fátua, nua e fantasmal
E tua sorte é dom de ver em sepulcral vidência.

Canto sagrado, rachado ao meio de mim
Teu arado de prata é mãe novata de luzes
Cruzes de vileza
Dorme o sono do profundo sem fim
Sidéria Astarte que nos inocula
Escura luxúria
E Spleen.

 

 

 

***

 

 

 

ALMA-LÂMINA

 

a palavra alma
está estrategicamente (es)contida
na palavra lâmina.

 

 

Marianne Liuba Löhnhoff, que assina literariamente Mariana L., nasceu do Rio de Janeiro. Cursou dois anos de Filosofia na USP e Letras na Universidade de Albstadt-Sigmaringen, na Alemanha. Trabalha como tradutora e professora de Línguas, vive entre São Paulo e Rio. Publicou em revistas como a Germina e a Revista de Artes da Kazuá. Lançou, em dezembro de 2014 pela Editora Kazuá, seu livro “A Mais Atada à Tua Palavra – O Caderno de Mariana L., em Mãos, Seguido de Avulsos do Poeta B”, que tem a organização, prefácio e posfácio do poeta Luciano Garcez. Prepara o lançamento de seu segundo livro para fins de 2016, baseado na lenda de Fausto: “Kleine Faust”.

 

 

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