O ENCONTRO
Mariana Ianelli
Dá-me um acontecimento
E eu nada direi sobre isso.
O crime perfeito
Será meu segredo
Fechado por dentro
Em silêncio
Como um vício.
Face à justiça dos homens
Há de me salvar
A vida rotineira
Entre mil outras tão parecidas.
Irei mansamente,
Azul sobre azul,
Sem que desconfiem.
(Quase diurna, eu diria,
Não me turvasse o delírio.)
E no passeio dos lobos,
Teu sangue meu sangue,
Para o chão
Águas e limites.
Repleta do terceiro corpo,
Em asa de luz
Nada direi sobre isso.
De línguas mortas
E um tempo morto
Farei caixa de guardar
Minha fé ilícita.
***
O AMOR E DEPOIS
Era esperado que aos poucos
Definhasse, fosse desaparecendo
Naturalmente levado pelo sono.
Era suposto que por abandono
Morresse –
E não teria o vento nenhum sentido
De ventura, seria apenas
A passagem de uma hora branca,
Entre outras tantas,
Para um coração manso
Que já nada espera nem recorda –
Como se o tempo não devorasse
Também o desconsolo,
E dele fizesse exsudar um leve perfume,
Como se não arrastasse
Cada corpo uma penumbra,
Como se fosse possível
Em vida a paz dos mortos.
(Mariana Ianelli nasceu em São Paulo em 1979. É poeta e mestre em Literatura e Crítica Literária (PUC-SP). Publicou os livros de poesia Trajetória de antes (1999), Duas chagas (2001), Passagens (2003), Fazer silêncio (2005), Almádena (2007) e Treva alvorada (2010), todos pela editora Iluminuras. Participou dos livros Dicionário Amoroso da Língua Portuguesa (Ed. Casa da Palavra, 2009), Roteiro da Poesia Brasileira – anos 90 (Ed. Global, 2011), Caminhos da Mística (Ed. Paulinas, 2012), entre outros. Tem poemas publicados em Portugal, Espanha, Cuba e Argentina. Em 2008 recebeu o Prêmio Fundação Bunge (antigo Moinho Santista) na categoria Juventude. Em 2011 obteve menção honrosa no Prêmio Casa de las Américas (Cuba) pelo livro Treva alvorada)
É sempre uma carícia na alma ler Mariana Ianelli.
Parabéns, Leila e Fabrício pelo Diversos Afins, cada vez melhor!
Um abraço!