Janela Poética II

Iolanda Costa

 

Foto: Kristiane Foltran

 
sortilégio

 
Um geômetra dos sólidos, vago
gira, embaraçado
à linha, ao diâmetro da carne:
suas figuras vazadas de plano e espaço.

Não vê a mulher, a ruína
a doce espádua nua e coruscante
das que copulam
as sete luas que lhe fulguram o pescoço.

Ela quer o testículo, o seminal
o esfero contíguo e providencial
das Causas Primeiras
transubstanciado.

O colo ungido em ceia mística.

 

 

 

***

 

 

 

brasil

 
A rã do ar invertido
de teu nome não salta:
coaxa como rãs, anãs
a fêmea muda que não coaxa
a língua longa que não alcança
o acento, o inseto, o insulto.

Teme o enxame, órbita-cócora
de brejo em brasa:
sapo sapa sepo
ipiranga tímida que não asa
itininga fúlgida que não flora.

 

 

 
***

 

 

 
ófris

 
do aéreo ao mediterrâneo
sibila a orquídea
seu voo de sépalas.

também a palavra
tem formato de moscas
e zune

sibila em sépia poesia tinta
sua escritura rumorosa:

asa-fulva-flor
de céu interior.

 

 

 
***

 

 

 
ceifa

 
não pinta tanto o lábio
a morte desfaz a boca, a cor
a escarlata do fruto
o rosa encarnado nos sexos

cuida da mortalha, do feno
a vida, bem se vê
não é uma gramínea
de flores nuas
abertas ad infinitum

arranca, do quadril
o colar de absinto

 

 

 
***

 

 

 
outono

 
arde em folha
seus degredos:
casco fóton salso
ulvas-vulva
céu sargaços

quisera do amor
a mão sobre o sexo
a textura do véu
a blusa florada
o indie folk de sais

renascidos ares, abril
onde a pele propulsa
encardida
e a tudo o sol ilumina

 

 

 
***

 

 

 

tear

 
meada
entre
meada

o algodão em flor

gosma, do liço
seu amarume
de estames

 

Iolanda Costa (Itabuna-BA), graduada em Filosofia, é arte-educadora e especialista em História Regional. Editou, artesanalmente, folhetos de poesia “Às Canhas as Palavras Realizam Mil Façanhas” (1990), “A Óleo e Brasa” (19991) e “Antese” (1993). Tem poemas editados em jornais, antologias, revistas eletrônicas e blogs. Participou do Livro da Tribo (2013). É autora de “Cinema: Sedução, Lazer e Entretenimento no Cotidiano Itabunense” (2000), “Poemas Sem Nenhum Cuidado” (2004), “Amarelo Por Dentro” (2009), “Filosofia Líquida” (2012) e “Colar de Absinto”, no prelo. Coordena a Coleção de plaquetes “Pedra Palavra” (2012 -2017).

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