Janela Poética III

Neuzamaria  Kerner

 

Foto: Pedro Alles

Foto: Pedro Alles

 

Contenda

 
Eu remo.
Em algum canto hei de chegar.
Meu remo
……….chicote que espanca o mar.

Remo e navio navegam
Sobre um mar que é sem fim.
Remo e navio disputam
………..quem navega mais em mim.

 

 

***

 

 

Movimentos

 
Minhas tempestades
não são cerebrais
– são na alma…
chego a sentir
o meu corpo estremecer
todos os dias
a cada disparo do céu!

 

 

***

 

 

Como Tantos…

 
Como tantos
luto para aceitar a carne
que recobre o meu espírito.

Como tantos
canto mantras para a Lua
que de longe, silente, me escuta.

Como tantos
vivo entre eus e eu…
e como dói viver
num mundo que não considero meu!…

 

 

***

 

 

Eva

 

“Não é bom que o homem esteja só;
far-lhe-ei uma auxiliar igual a ele.”
Genesis 2,18.22-24

Disse a Ti um dia o sim.
Disseste a mim: tu és mulher!
Bênçãos me deste
e em todo o teste a mim imposto
saí vitoriosa.
Até reinei num paraíso…
Pueril, a todo tempo mostrei riso
e nesse riso me fiz rosa.
Explorei o chão que me foi dado
vi tudo o que ali havia
provei até do que não podia
– não me fora permitido provar.
Tu
Temendo o desabrochar que me possuía
disseste: “pecadora, vai embora,
não serás mais a senhora
do jardim que preparei!”

Aquele momento de queda
eu nomino salvação para as minhas
descendentes, insubmissas, conscientes,
sacerdotisas guardiãs da fábrica da vida
– presente sem medida para o mundo do
amor.

Tua cria – Te louvei
Tua alma habitando em mim.
Me deste o conhecimento
da bondade, da malícia, da perícia em parir.

Não carrego culpa ou dor
dentro ou fora do jardim,
posto que onisciente
me soubeste pura e sã,
e eu Te sei meu conivente
no episódio da maçã.

 

 

***

 

 

Jogo

 
Jogo com palavras
e elas comigo
no eterno dos espaços.

Opção:
jogar xadrez
no tabuleiro dos textos.

Quando sonolentas e frágeis
eu nelas
…………….– xeque-mate!

Quando tomam vestes guerreiras
me aprisionam
me checam e matam!

 

Nasci no século passado com fome de palavras e até hoje vivo desse alimento que ainda me sobra para adornar o espírito de quem tem o peito aberto. O teto que me foi dado para viver é dividido com 7 bilhões de pessoas de todas as cores, de todas as falas, de todas as caras, de todos os credos; com todos os que vivem na carne e os que vivem em forma de fluido cósmico universal. Sou feita à imagem e semelhança da humanidade porque dentro de mim cabe a mais doce ou a mais vil das criaturas. Troquei, doei e recebi saberes com estudantes de vida assim com eu. De certa forma ainda vivo assim porque trocar e doar são atributos da generosidade, menos que da justiça. Dentro desse esquema (trocas, doações, recebimentos) escrevo porque na medida em que faço isso me somo e me divido neste mundo que é nosso.

 

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2 Comentários

  1. Belíssimos!Parabéns Neuzamaria!

  2. Neuzinha,bela poeta, saudades de você.bjs

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