Sel
há tempos
teu nome não
soa em mim
ressumbrando
dores, reabrindo
feridas; o dorso
distante não
abriga mais o
delírio
das mãos que
hoje
apenas
se esquecem no ar
onde tudo me
escapa de ti e
o amor não
forja a lâmina
***
Silêncio
Percorri corredores
observando tumbas
com ossos cariados
vislumbrei súplicas
em faces que não se
moviam; carreguei
os mortos e o aroma
pútrido lambia minha
calma. Limpei os seus
dejetos e os dos que
ainda agonizavam
esperando a sua vez…
***
lou.cu.ra. s. f. 1. ferrete, óleo
pedra. 2. ave-langue-sorriso. 3. a
gengiva dura. 4. fulgor que apenas
conserva o hálito aquecido das orações
5. tua voz calma diluída sobre um
tempo queimante
***
Eu caminhei buscando um coração
Desviando-me de pedras e tentando manter meus olhos abertos em meio à poeira
Entretanto, não compreendia que tudo já havia se corrompido
Meus dedos, minha boca, meu corpo
Nada mais sem o fardo essencial daquele que eternamente procura
As luzes piscaram, prenunciando a minha morte
E eu rezei para que alguém me salvasse nestas noites impuras
Mas o que eu apenas pude ver foi a minha própria imagem
Eu em fragmentos, enquanto meus pés seguiam tortuosamente…
***
O cabelo, a princípio, não revelara nada
Fino e negro rio, escondia o marfim e o fruto
Eram apenas linhas que rutilavam na fraca luz
Silhuetas das dunas do Maranhão, eternas fugidias
Névoas e sódio, o grande mistério de Anticítera
Eram membros, tênues movimentos, o tronco
A delgada geografia de sua terra revestida de neve
Era somente um sussurro branco sob véu de chumbo
O revérbero de um astro distante, lânguida paisagem
Eram mãos pequenas, duas conchas à espera do mar infinito
***
é cedo… e tudo ainda arde
a dor não é física, ainda que física
a angústia, a solidão, não são corpóreas, ainda que corpóreas
o vazio, ainda que vazio, é cheio de algo que não tem nome
Sel é poeta e artista visual. Possui textos publicados nas revistas literárias euOnça e Benfazeja. É autor dos livros: Autopse (ed. Multifoco – 2012) e [Sel]vageria (ed. Urutau – 2016). Ambos de poesia.