Janela Poética V

Caio Carmacho

 

Ilustração: Vera Lluch

 

livre-me III (ensaio & conclusão)

 

livre-me como um pedido do livro-objeto
um mendigo que dá moedas no semáforo
um slogan de modess

livre-me como passe de mágica
oferenda de réveillon
abolição da autorreferência

livre-me: um mantra
uma proposta
um estratagema

livre-me dos rótulos
dos complexos
olheiras
correntes

literárias ou não

livre-me dessa cruz pesada
leve-me para casa
lave-me com buchinha

and love me
como se não houvesse amanhã

 

 

***

 

 

porção para dois

 

amar
é substância estranha
insuficiente quando não boba
desnorteada

porque
antes de tudo
é palavra avulsa
solta no boçal
da boca louca

vai se metendo em tudo quanto
é brecha – clara e escura

por presságio,
quando damos conta do estrago,
já era

virou coração viajado

e uma romântica porçãozinha
de frango a passarinho

 

 

***

 

 

ESTE LADO PARA CIMA

 

não se deixe enganar caro leitor,

para ler este poema é necessário
CUIDADO
muito cuidado

sua arquitetura branca e
FRÁGIL
pode não impressionar no princípio

afinal, para compreendê-lo a fundo é preciso
familiaridade e um manual prático
para interpretação de tipos

porque nem toda surpresa vem embrulhada
em papel de presente

nem toda surpresa
inclui pilhas

nem toda surpresa
chega lacrada com um
cartão: de: para:

que nem todo entregador não
consiga violá-la

porque o poema, caro leitor,
é um eterno convite

conteúdo que cabe
numa embalagem que se abre

 

 

***

 

 

informe publicitário

 

é necessário dizer
em caráter de urgência
que a vida não é só alarde

que a coisa mais sensacional do universo
está em falta no mercado

que o horário de funcionamento
varia de acordo com o feriado

que o preço da prateleira
não corresponde com o do caixa

que ser eleito o bebê hipoglós amêndoas
é uma vergonha desnecessária

que a promoção relâmpago
do amor-próprio
encerrou semana passada

 

 

Caio Carmacho  nasceu em São Paulo, cresceu em Paraty e mora, atualmente, em Piracicaba. Publicou Livre-me (2013, Editora Patuá). Escreve no blog Noutratez, organiza todo ano o sarau poético Picareta Cultural e é um dos curadores da OFF FLIP de Paraty.

 

 

 

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1 comentário

  1. O seu poema dito frágil não precisa de embalagem mesmo. É muito bom
    Maria lindgren

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