Janela Poética VI

Dirk von Petersdorff

Tradução: Viviane de Santana Paulo*

 

 

Ilustração: Thaís Arcangelo

 

 

 

No museu da história

 

Uma caixa de vidro iluminada,
no interior uma pedra cinza,
as bordas lascadas,
e assim ocorre-me ainda,

quão absorto eu sentado estava,
em Kiel, à mesa da cozinha,
quando a notícia surgiu,
quando o Muro caiu.

 

Im Museum der Geschichte

 

Ein Glaskasten im Licht,
darin ein grauer Stein,
der an den Rändern bricht;
und also fällt mir ein,

wie ich versunken saß,
am Küchentisch in Kiel,
als die Meldung kam,
als die Mauer fiel.

 

 

***

 

 

Fliperama

 

Pena! Inferno! Susto e dor!
Espasmos! Tinidos! Abismos não!
Oh rapidez! Alavanca! Torção!
Luzes! Sim! Nova cor!

Mas certamente, deve-se planejar,
pode-se apontar o alvo e é preciso adivinhar –
rio de luzes, dança eufórica,
oh, quem sabe, medo e glória.

 

Flippern

 

Jammer! Hell! Schreck und Pein!
Zucken! Klacken! Abgrund nein!
Ach vergeh! Bumper! Drall!
Leuchten! Yes! Neuer Ball!

Aber sicher, man soll planen,
man kann zielen und muss ahnen –
Lichterfluss, schneller Tanz,
ach wer weiß, Angst und Glanz.

 

 

***

 

 

O futuro começa

 

como no quadro de Rafael a Madonna
na parte inferior da obra o arranjo,
a próxima geração – anjos,
com quase um bocejo à tona.

Velha é a magia,
um sorriso principia
nos lábios, e entretanto –
o que sabem os anjos?

A cabeça apoiada na mão,
já não é tão
ao fundo da moldura
nem tanto consola a formosura.

 

Die Zukunft beginnt

 

wie auf Raffaels Madonna:
Am unteren Bildrand lehnen
die Engel – nächste Generation.
Die müssen fast gähnen,

der Zauber ist alt,
ein Lächeln wächst
auf den Lippen, und bald –
was wissen die Engel?

Den Kopf in der Hand,
schon nicht mehr ganz da
am unteren Rand
ein trostreiches Paar.

 

 

***

 

 

Eles se encontram no corredor

 

Meu filho veste camisa amarela com letras irregulares,
onde cavaleiros erguem espadas de lasers
e uma cobra dá de cara com uma pantera –
para mim são coisas já passadas nesta vida.
Mas estou na posse de vitórias antigas
como um menino na bicicleta que conquistou a glória,
porque ela, oh Deus, subiu na minha garupa,
tocou meu quadril, – corrente elétrica.
Ainda acontecerá com o menino:
o sútil, incerto futuro-flamejante,
o corar abrasador até as orelhas
e a impaciência, o pulso querendo acelerar.

………O homem tira lentamente a gravata,
………o menino passa empurrando a bicicleta.

 

Man trifft sich im Flur

 

Mein Sohn trägt gelbe Shirts mit Zackenschrift,
wo Ritter ihre Laserschwerter heben
und eine Schlange einen Panther trifft –
das ist für mich vorbei in diesem Leben.
Doch bin ich im Besitz von frühen Siegen
als Fahrradfahrer, der dem Glück erlag,
denn sie, oh Gott, ist hinten aufgestiegen,
fasst meine Hüfte an, Elektroschlag.
Das steht dem Jungen alles noch bevor:
das feine, ungewisse Zukunfts-Brennen,
die heiße Röte bis hinauf zum Ohr
und Ungeduld, der Puls will immer rennen.

……..    Der Mann macht langsam die Krawatte frei,
……..    der Junge schiebt sein Mountainbike vorbei.

 

 

***

 

 

10º andar,

 

edifício com ar condicionado, celeiro dos mortais.
Fique frio, sorria, o mais alto é o 19º,
minha guia, enfraqueço, quando
passo por um bando de secretárias
maquiadas, ménades, bocas trêmulas
….. para que a encenação?
seus pensamentos
….. chamamos de volta
surgem quando falam
….. tudo como sempre
e displicentes comem donuts
esperando a existência, e nisso acompanha
a música: tudo é bom, canta
Madonna, que quer saltar no Etna;
e em frente as janelas precipitam-se
as núvens passageiras, cinza profundo, depois a queda
de brilho no escritório espaçoso,
manchas de luzes na tela da face,
sussurro de fax, eternamente – ok, ok,
há inúmeros purgatórios, há
televisão após a morte do moderador,
se eu, por favor, pelo menos, a chave
o código, do local
o âmago – ela riu.

 

10. Stock,

 

klimatisiertes Hochhaus, Tenne der Sterblichen.
Cool bleiben, lachte, höchstens 19,
meine Führerin, schwach ich, als
wir einen Schwarm von Sekretärinnen
passierten, geschminkt, mänadisch, zappelnde
Münder
……..was soll das Theater?
ihre Gedanken
……..wir rufen zurück
entstehen beim Reden
……..alles wie immer
nebenbei essen sie Donuts u.
warten auf die Existenz; dazu
die Musik: Alles ist gut, singt
Madonna, sie will in den Ätna springen;
und vor den Fenstern rasender
Wolkenzug, tiefgrau, dann Stürze
von Helligkeiten im Großraumbüro,
Lichtflecken, auf einem Schirm Gesichte,
Fax-Surren, ewig – okay, okay,
es gibt zahlreiche Fegefeuer, es gibt
Fernsehen nach dem Tod des Moderators,
wenn ich wenigstens, bitte, den Schlüssel,
den Code, was den Laden
im Innersten – sie lachte.

 

 

* Viviane de Santana Paulo (São Paulo), poeta, tradutora e ensaísta, é autora dos livros Depois do canto do gurinhatã, (poesia, editora Multifoco, Rio de Janeiro, 2011), Estrangeiro de Mim (contos, editora Gardez! Verlag, Alemanha, 2005) e Passeio ao Longo do Reno (poesia, editora Gardez! Verlag, Alemanha, 2002). Integra as antologias Roteiro de Poesia Brasileira – Poetas da década de 2000 (Global Editora, São Paulo, 2009) e Antología de poesía brasileña (Huerga Y Fierro, Madri, 2007)

(Dirk von Petersdorff (1966/Kiel) é poeta, ensaísta e crítico literário. Estudou filologia germânica e história na Universidade de Kiel. É professor de literatura alemã moderna na Universidade de Jena. Dirk também é membro da Academia de Ciências e Literatura de Mainz (Akademie der Wissenschaften und der Literatur) e do Centro Internacional de Pesquisa Clássica (Internationalen Zentrums für Klassikforschung). Em 2006, foi membro do júri do Prêmio Kleist (Kleist-Preis))

 

 

 

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