Olhares

RITOS SILENTES – A SÃO PAULO DE SILVIO CRISÓSTOMO

Por Fabrício Brandão

Foto: Silvio Crisóstomo

 

Tudo um mar de saliências e reentrâncias. Tudo a cortina invisível que paira sobre almas. Na vastidão da matéria, um imperceptível fio das horas vai alimentando espaços, perscrutando os becos do homem. Há uma curiosa ordem no silêncio ruidoso da metrópole. Ainda uma São Paulo que desampara e repulsa os seus. Ainda uma cidade que apascenta sonhos, fugas, delírios e bebe os prazeres da cosmovisão. Em meio a isso tudo, o olhar do fotógrafo, num contínuo ato poético, varre as alamedas do despercebido.

O andarilho da luz em questão é Silvio Crisóstomo, dono de um olhar que subverte o óbvio e o torna caminho viável da criação. Sua trajetória na construção das imagens nem de longe se presta a representações exasperadas do real. Interessam-lhe mesmo as esferas sutis que seres, lugares e atmosferas de abstração ousam descortinar por entre os dias.

Foto: Silvio Crisóstomo

Silvio é um ser de espanto na medida em que transita errante por uma cidade e seus tons repletos de mistérios. Ele mesmo revela não ser um apaixonado por São Paulo. O resultado disso é um comportamento que lhe rende uma observação isenta de afetações e deslumbramentos. Por suas lentes, a lira colossal paulistana compõe um vasto painel de estranhamentos. E é assim, com resignado afastamento afetivo, que a selva de pedra reina sublime e nada usual nos registros do artista.

Nascido em Maceió, Alagoas, Silvio reside em São Paulo desde a mais tenra idade. Atraído pelo imprevisível, seus trabalhos assumem um caráter essencialmente intuitivo, sem amarras pré-definidas e com o gosto incessante pelo mistério encerrado nas coisas. Admirador de fotógrafos como Andreas Gursky e Thomas Farkas, revela que suas maiores referências estão nas artes plásticas e no cinema. Em seu caminhar, estão inclusas diversas exposições e eventos.

Foto: Silvio Crisóstomo

Ao percorrer a maior cidade da América Latina, Silvio Crisóstomo fala-nos também de uma megalópole estrangeira a muitos de seus naturais. Uma espécie de vazio impresso pela dinâmica corriqueira dos habitantes emerge dos rastros civilizatórios. E em meio à sinfonia de concreto, regida pelas mais variadas perspectivas de intervenção arquitetônica, pulsa, ainda desconhecida e neglicenciada pela voracidade da pressa e do imediatismo, a poesia escondida das horas. A cada um, por seu curso, é dado lê-la.

 

 

* As fotografias de Silvio Crisóstomo são parte integrante da galeria e dos textos presentes na 76ª Leva

 

 

 

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2 Comentários

  1. Belíssimo! Olhar inédito sobre o cotidiano da metrópole.

  2. Silvio,

    Não existe amor em SP. No entanto, artesãos cultivam jardins em nichos íntimos, quando acham espaço. As fotos o demonstram.

    Abraços!

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