Olhares

Paralelismo de sensações

Por Fabrício Brandão      

 

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Arte: Helena Barbagelata

 

Entre os atos, pairam taciturnas outras existências. Viver é esse gesto colossal de colecionar mistérios e avançar por sobre eles sem que saibamos ao certo suas origens mais imediatas. É flertar com o desconhecido que nos apresenta suas investidas cotidianamente. Embora busquemos natural abrigo no algo concreto e visível, somos tomados vez ou outra pelas garras da abstração.

Quando não sabemos lidar com o intangível, muitas vezes sentimos que perdemos a desejada capacidade de controlar as coisas ao nosso redor. É muito mais do que uma mera questão de se ir além da superfície. Um percurso de rotas que nos atraem rumo ao estranhamento de nós mesmos.

Para além das experiências corporais, há trajetos de invenção e sonho. Almejando alguma espécie de libertação, um criador se rende aos atributos desse caminhar por dimensões imateriais. Assim, o que parece ocorrer é que um curioso processo de reconhecimento se opera, tornando a vivência das situações um mirar de faces diante de um espelho.

Para uma artista como a portuguesa Helena Barbagelata, o outro lado do espelho reflete uma esfera de vivências na qual o físico e o abstrato convivem harmoniosamente. É como se um ambiente único de percepções surgisse, mesclando o real e o onírico, o vivido e o imaginado.  Tudo num organismo amalgamado que processa as mais complexas questões do olhar.

 

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Arte: Helena Barbagelata

Helena expõe certas densidades humanas. Mostra-nos um conjunto de gestos, externa rostos carregados de sobriedade, aponta trajetos do corpo. Em lugar de entabular razões, a artista utiliza como principal ferramenta um prisma poético sobre as coisas observadas. É, de fato, uma valiosa escolha na medida em que os recursos da sugestão promovem uma ideia de que as vias estão abertas para captar algo que não habita o território das obviedades.

Nascida em Lisboa e hoje vivendo em Atenas, Helena há muito percorre caminhos em torno das artes plásticas, música e literatura. Na seara literária, colaborou com revistas internacionais, obteve prêmios e publicou a obra Soliloquia (Apenas-Livros, 2013). Em matéria de artes visuais, suas criações transitam entre a pintura e a fotografia.

Considerando a arte como um diálogo entre criador e receptor, a artista lusitana abre fronteiras para a libertação do olhar, ponto no qual quem contempla é capaz de vislumbrar outros significados para a criação. Ainda, segundo Helena, os caminhos percorridos levam a uma alternativa não somente de autoconhecimento, mas também de descoberta do homem em relação a seus pares e ao mundo.

Contemplar a obra de um alguém como Helena Barbagelata é apostar na existência de dimensões ilimitadas e paralelas em convivência. Na intersecção entre o palpável e o inventado, percebemos uma sucessão de camadas de vida. São saberes do ato de existir, noções que apenas são percebidas porque se ousou experimentar a continuação dos passos.

 

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Arte: Helena Barbagelata

 

Fabrício Brandão é um dos editores da Revista Diversos Afins. Cultua livros, discos e filmes com amor táctil e espiritual.  

 

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