Olhares

Por entre os vãos da espera

Por Fabrício Brandão

Suzana Latini

Foto: Suzana Latini

Um caminhar de passos desavisados diante dos cenários espontâneos do mundo. Universo a agregar um só ritual: olhar a tudo e a todos com naturalidade. É preciso maturar o pensamento, deixá-lo orbitar em suspensão no deslocar do tempo. Esperar é maior virtude de quem reverencia silêncios e se deixa tomar pela epifania da vida tal como ela é.

Sim, é preciso falar de esperas. Daquelas que nos permitem respeitar a essência das coisas. É urgente exaltar esperas quando isso implica em testemunharmos exercícios de liberdade. Liberdade que vem do outro, sua mais genuína expressão humana. Liberdade em poder sentir o que a natureza e o fenômeno contido na disposição das coisas encerram com sua vasta linguagem.

Quando uma artista como Suzana Latini evidencia em suas andanças criativas o poder da espera, notamos que captar a vida é deixá-la simplesmente acontecer. O marco de sua atuação como fotógrafa é o desejo puro de se lançar ao mundo e ser surpreendida por ele. Assim, o externo, com toda sua carga de possibilidades e perspectivas múltiplas, é quem assume um papel ativo. Revertendo uma certa lógica tradicional, Suzana é registrada pelo mundo.

Ao aguardar que seres e lugares lhe apontem suas naturais rotas, Suzana fideliza a experiência de perceber as coisas tal qual elas se manifestam. Seja observando pessoas, objetos, lugares ou testemunhando eventos da natureza, a fotógrafa não tenciona roteiros premeditados. Quem aqui opera é o destino, com a força de suas revelações, com a pungência do novo a causar fissuras na rotina dos dias.

Suzana Latini

Foto: Suzana Latini

No ritual de se deixar envolver pelos matizes do destino, Suzana enaltece cores, formas, sombras, paisagens e silêncios. Nalguns momentos, há a presença viva de pessoas a delinear os ambientes flagrados; noutros, irrompem espaços tomados pelo vazio, todos eles prenhes de ausências humanas, porém lugares de possíveis memórias.

Nascida em Belo Horizonte, Suzana Latini formou-se em Artes Plásticas pela Escola Guignard (Universidade do Estado de Minas Gerais). Durante toda a sua trajetória, esteve envolvida com produção, principalmente de vídeos e fotos publicitárias. Confessa que seu olhar procura aquilo que ninguém presta atenção, além de creditar fascinação ao que está por trás de banais instantes da vida.

Para manter a liberdade, esse bem que nos é tão caro nas suas mais variadas acepções, Suzana prefere não se entregar profissionalmente à fotografia. Mesmo assim, seus registros estão disponíveis para aquisição do modo genuíno como foram captados.

Quando o ato de observar o mundo, seus fenômenos e personagens, destina-se ao menor nível possível de interferência, por certo homérica tarefa, há um desejo maior de preservar a essência da existência. Nesse trajeto, existem tanto cenários concretos quanto os que são frutos de nossas abstrações. A espera, essa senhora memorável, vem nos fazer recordar que cada contexto experimentado guarda seus inadvertidos trunfos.

Suzana Latini

Foto: Suzana Latini

*As fotografias de Suzana Latini fazem parte da galeria e dos textos da 110ª Leva

Fabrício Brandão edita a Revista Diversos Afins, além de buscar abrigo em livros, discos e filmes.  

 

Clique para imprimir.

Comente

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *