Olhares

O enraizamento das formas em Bianca Lana

 Por Fabrício Brandão

 

Ilustração: Bianca Lana

 

Constantemente atravessados pela urgência exterior do mundo, somos atingidos pelo excesso das aparências. Quando definimos um objeto, tentamos primeiramente buscar referências anteriores dentro daquilo que habita o plano mental, algo determinado por uma tradição pretérita que avança no tempo. Muitas coisas, quando tomadas por um sentido de percepção material, remontam a significados construídos por elaborações já estabelecidas, delimitando ou até mesmo restringindo as possibilidades de interpretação em torno delas.

Sob o manto visível das composições figurativas, há muito mais do que uma mera acepção plástica dos temas representados. Entendendo a arte como uma ferramenta que desvela fronteiras, desconfiamos que a exterioridade não apenas de objetos, mas também de pessoas, funciona como uma via de acesso a uma outra dimensão, condição que abriga um conteúdo de caráter intangível por natureza.  Comportando-se como uma ponte entre dois mundos, o ambiente das formas aparentes prenuncia de algum modo o que está encerrado em seu interior.

Quando um artista percebe esse lugar como uma zona de transição, e não como algo fixo, intransponível e estanque, o resultado é impactante.  E o que mais chama atenção nesse momento de descoberta é entender que a visão do criador é capaz de superar determinismos do olhar. É um ir além do aspecto físico e, portanto, inicial das experiências. Movimento de se deixar invadir pela dimensão intrínseca de seres, coisas e lugares.

E assim o faz gente como a artista plástica Bianca Lana, que, apostando numa densa imersão nas mais variadas expressões humanas, faz dos seus trabalhos visuais algo pungente. Em suas linhas, cores e formas, Bianca ousa sondar territórios intimistas e que trazem em si uma minuciosa noção de profundidade do olhar. Sua arte está fundamentalmente voltada para a essência da condição humana.

 

Ilustração: Bianca Lana

Em seus desenhos, pinturas e ilustrações, predomina uma perspectiva de se conceber o que está além do ordenamento físico das coisas. É quando Bianca nos propõe um corte profundo na superfície que reveste a face dos homens. Fazendo uso desse viés, suas investidas assemelham-se a um momento de contemplação visceral, um desnudar das formas apontando para a revelação nem sempre sublime dos sentimentos.

Influenciada por nomes como Adara Sánchez, Agnes Cecile, Tonny Tavares e Nestor Jr., Bianca Lana prima pela utilização de aquarela, tinta acrílica e técnica de pontilhismo com nanquim. Em sua ainda breve trajetória, já integrou tanto exposições individuais quanto coletivas.

De modo confessional, Bianca sustenta que sua arte, além de evidenciar aspectos simbólicos, intenta representar um painel de angústias inerentes ao ser humano. Nesse vasto e complexo ambiente, seus mergulhos criativos estão direcionados para uma valorização das interioridades. E é com essa característica que lhe é peculiar que a jovem artista paulista faz do seu ofício um salto para o mistério, sobretudo se pudermos atestar que nossa existência é uma espécie de trajeto rumo ao desconhecido.

Aquilo que abrigamos na raiz de nossas individualidades costuma encerrar uma multiplicidade de sentidos. Todos eles podendo encontrar terreno fértil diante da atmosfera intangível que permeia nossas construções de mundo. Há muito por ser descoberto dentro de nós mesmos e é tão precioso quando um artista nos incita a tamanha constatação.

Ilustração: Bianca Lana

*As ilustrações de Bianca Lana fazem parte da galeria e dos textos da 117ª Leva

 

Fabrício Brandão edita a Revista Diversos Afins, além de buscar abrigo em livros, discos e filmes.

 

 

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