Tiago Dias
Os poemas seguintes são uma singela homenagem a Orides Fontela, o verdadeiro pássaro de sol que ainda existe.
Nunca amar o que não vibra nunca crer no que não canta*
deixar a porta aberta para varrer o chão
com a voz entardecida ter no canto a cigarra
a escrever um haicai sabido que da vida
leva-se as chances de ter cantado.
no movimento dos braços a fé no suor
a construir a dança fecunda
como os pés apoiados no chão
varrer o chão com a porta aberta
ter as primaveras para lembrar
da procrastinação ou não
esquecer para olhar o céu
agrestes pássaros de sóis
***
Ouvir um pássaro agora ou nunca*
feitos de fotografias e espadas
penduradas na parede branca
seus gestos são o pêndulo
a oscilar natural
o prego
por detrás das fotografias e espadas
tal como a sacada
as flores de álcool e vozes
sob a sacada ainda
todas as cabeças planetas
sob a sacada axiomas
***
Mais vale o canto agreste do que o vívido silêncio branco além do humano sangue*
a nossa voz vive
no oco do oco
de onde levanto os olhos
mesmo que ofusque
as retinas e siga
desfocando tudo talvez
essa seja a solução
quero beber da mesma água
em que me banho
a correnteza arando as minhas costas
esfoliando a pele preparando
quero ser solo sempre
***
Ouvir um pássaro é sempre*
há uma linha indizível
dentro de cada um de nós
por onde escorregamos
um paradoxo que bebemos
comemos como tremoços
não há nada mais fluido
do que a vida uma linha
não virgem
mas intensamente
…………….prenhe
de outras linhas mais finas
que desenham motores
ventanias tufões alaridos
cores até cores
***
Mais vale o pássaro mais vale sangue*
o anti-pássaro carrega
em suas asas o olhar
sobre o seu tempo nada
é mais urgente nada
do que o seu voo
manipulando a luz
na nossa face e pensa
que é muito fácil ser adorado
o anti-pássaro é o sangue
***
A estrela da tarde é infecunda e altíssima*
carrego no bolso uma folha
de erva-cidreira para aceitar
o vermelho da rosa entre espinhos
carrego o bolso furado
e o coração atento
para o que posso dar
quando faltar-me o chão
novamente o que posso dar
como pingos de chuva a cair
no mar somos água
enchendo e vazando carrego
no bolso uma folha
(* )Orides Fontela
Tiago D. Oliveira, de Salvador-BA, professor e pesquisador, estudou letras na Universidade Federal da Bahia (UFBA) e na Universidade Nova de Lisboa (UNL). Tem poemas publicados em blogs, portais, revistas e jornais especializados como Avenida Sul, Canal de Poesia, Cronópios, Cultverso, Enfermaria 6 (Portugal), Escamandro, Hyperion (UFBA), Literatura Br, Mallarmargens, Musa Rara, Revista Saúva, Janelas em Rotação e Jornal Livre Opinião. Em 2014 teve seu primeiro livro editado de poesia, “Distraído”.
Nossa… Parabéns a revista a ao porta!! É uma centena de luz aos nossos olhos e as nossas sensações!!! Obrigada por Isso!!!
Que beleza de versos! Parecem canções na mata!
As palavras estão estampadas, fincadas no ar. Aqui, o poema tem uma força que brilha e que endurece. Parabéns, querido, e também à Revista.