Arriscamos dizer que há mais dúvidas do que certezas pairando sobre nossas cabeças sempre inquietas. A dúvida é, por si só, combustível do ato espantado de existir. E entendamos aqui por espanto não a obviedade primeira do susto, mas o incômodo capaz de nos movimentar e levar a questionamentos e ações mais efetivos sobre as coisas que nos acossam. A criação motivada pelos imperativos da arte parece ser eterna companheira desse vasto espaço de incertezas. E o fascínio sobre aquilo que desconhecemos e não dominamos pode levar a resultados dos mais instigantes. Um escritor ou um artista visual, por exemplo, flertam com o abismo na medida em que seus passos estão desgarrados da ideia de controle sobre as coisas. Explicando melhor, é considerar que certos resultados são pretendidos, mas estes nem sempre acontecem pelas vias naturais dos arremates desejados. Ao mesmo tempo, não se ter respostas para tudo pode gerar a fagulha do alerta permanente, sensação que faz com que criadores nunca se deem por satisfeitos com primeiras soluções e, desse modo, busquem o aperfeiçoamento de suas investidas recusando qualquer tentativa de acomodação diante de qualquer resposta que se mostre facilmente sedutora. Literatura, cinema, música, teatro, dentre outras expressões do delirante espírito humano, são tributários das inquietações que jamais cessam em nós. No trabalho de observação que fazemos aqui na revista, notamos uma imensa paisagem por onde transitam as mais diferentes subjetividades e seus projetos de mover suas apostas para além da incerteza. É quando notamos, por exemplo, o gesto que desacomoda coisas nos poemas de gente como JP Schwenck, Bruna Baldez, Anna Clara de Vitto, Helena Aranha e Ilza Carla Reis. Na entrevista feita por Rogério Coutinho com o escritor Rodolfo Guimarães Neves, assinaladas estão algumas reflexões pungentes sobre literatura, filosofia, cinema e política, dentre outros alvos. É Sandro Ornellas quem nos mostra as veredas de “A teoria da felicidade”, mais novo e sensível rebento da escritora Kátia Borges. No caderno de cinema, Guilherme Preger explora a temática das experimentações do real tidas no filme “Notturno”, do diretor Gianfranco Rosi. Por sua vez, Larissa Mendes traz à tona suas escutas precisas para o álbum “Inteiro Metade”, de Tagua Tagua. Nos contos de Márcia Barbieri, Alessandra Barcelar e Adriano B. Espíndola Santos, sintomas amplificados da condição humana. Na resenha de Gustavo Rios, atenções pormenorizadas percorrem “Cães”, romance de Júlia Grilo. Cruzam todas as esquinas e alamedas de nossa edição as ilustrações de Marjorie Duarte, artista que se move vigorosa pelas urgências do tempo e da avidez em comunicar mundos através de seu engenho criativo. Com toda essa reunião de potentes vozes, caras leitoras e leitores, trazemos com ânimo renovado a 143ª Leva. Bons mergulhos!
Os Leveiros