Dênisson Padilha Filho
VAI POR MIM, BABY
Uma rua de bares, uma massa de gente feliz à tardinha. No ar uma luz âmbar coloria os olhos.
― Veja uma longneck.
― Pra mim um Campari.
― O que vai fazer agora, que saiu de mochila?
― Sinceramente? Pensei em ir morar com você.
― Já falamos sobre isso…
― Já sei o que vai dizer: “espere ao menos completar dezoito”.
― Sempre falei isso, mas acho que você não entendeu. Queria dizer que você deve ter dezoito pra sair de casa, não pra morar comigo.
― Ah é? E que idade eu devo ter pra morar com você?
― Paula, não dificulte; você está entendendo. Você tem a idade da minha filha.
― Mas não sou sua filha!
― Aqui pode fumar charuto?… Pode? ― ao garçom ― O senhor tem isqueiro?
― O que você sugere então?
― Acho que você deve voltar pra casa de seus pais.
― Você deve estar brincando.
― Sério…
― É assim que você me ama?
― Não é questão de amar ou não; é bom senso. Não faça isso com seus pais.
― Você tá pensando mais neles do que em mim.
― Um pai morre de culpa com uma coisa dessa; vai por mim, baby, de culpa eu entendo. E depois…
― Sua ex!… Eu sabia!
― Ela não é apenas uma ex; é mãe da minha filha! É tão difícil entender? Tô até vendo ela me chamar de Polanski, Woody Allen… E você de Lolita.
― Quer saber?! Pra mim chega!
― Calma, termina o Campari, pelo menos…. Chega o quê? Aonde vai, vai viver de quê?
― Não lhe interessa… vou virar puta, pronto..
― Paula, sente aqui, vamos conversar.
― Aliás, virar não; porque sempre fui sua puta; mas agora pelo menos vou saber quanto custo.
― Paula, fale baixo, venha cá.
― Fale baixo uma ova! Pra mim deu!
― Putz!
…
― Garçom! Traz outra? … Conhece?
― De vista; mas não acredito que vai fazer o que falou. Sei que é de boa família. O pai vem sempre aqui.
― O pai vem sempre aqui? Sério?!
― Vem. Senta sempre nas mesas de fora.
― Putz! Nunca vi aqui! Nunca coincidiu.
― O senhor conhece o pai dela?
― Conheço demais! Amigo de mais de vinte anos.
― A menina, então, o senhor viu nascer.
― Ah vi. E digo mais, aquela ali é como se fosse minha filha! O senhor pode trocar o cinzeiro?
― Pois não, senhor.
No bar em frente, uma música feliz, a massa de gente crescendo, e a mesma luz eufórica dançava na curva de cada rosto.
Dênisson Padilha Filho (1971) é baiano. Escritor e roteirista de audiovisual. É mestre em Cultura e Sociedade pela Universidade Federal da Bahia. Publicou “Menelau e os homens” (2012, contos e novelas), “Carmina e os vaqueiros do pequi” (2003, romance) e “Aboios celestes” (1999, contos). Em 2014, lançou “O herói está de folga”, volume de contos publicado pela Editora Kalango.
Isso se chama passar a vida a limpo e, para fazê-lo tão bem, uma cerveja é pouco. Que bela representação do “real”, cara!
Obrigado pelas palavras, José Carlos.
Um abraço.