Janela Poética II

Desenho: Felipe Stefani

 

ONDA

Elizabeth Hazin

 

o desejo é como água:
flui
circunda
onda mais alta
(de cor profunda)

o desejo é como água
(de mar ?):
sempre distante do porto
e o que fazer do corpo
apenas invólucro
– breve,
finito –
e, portanto, sequioso
do próprio desejo
em que se afunda ?

sobre o cetim da pele
desliza a veste que escolho
ou nenhuma veste

o desejo é como água:
flui  reflui
escorre   inunda
o corpo
(quem bebe ?)

 

 

***

 

 

DESDE O FOGO

 

Sou triste
desde o fogo impresso na argila:
odeio todos os deuses.

Minha tristeza vem desde o nome
a revelar-me  a sede
a fome
a farsa que me corrói a face
nua.

Não quero essa alma que me queima:
de  barro estava bem.
Arde em meus olhos o desejo dos deuses
(como o dos homens).

Não quero a palavra
acesa
que à minha revelia me incendeia:
de repente
é impossível  restar calada.

Desde o fogo
a tristeza nos consome.

 

(Elizabeth Hazin publicou Poesias (1974), Verso e reverso (1980), Casa de vidro (1982), Arco-íris (1983), Espelho meu (1985), Martu (1987) e O arqueiro e a lua (1994). Em 2006, a Vieira & Lent reeditou uma segunda edição — revista e ampliada — de Martu, livro vencedor do Prêmio Rio de Literatura (1986) e a Editora 7Letras publicou o livro escrito a quatro mãos com Davino Sena: Lêgo & Davinovich. Em 2010, foi re-publicado pela Vieira & Lent o Arco-Íris, poemas para crianças. Já ensinou nas universidades federais de Pernambuco e Bahia. Atualmente, é professora de Literatura Brasileira na UnB – Universidade de Brasília)

 

 

 

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