Ana Peluso
Narrar os pequenos acontecimentos do dia
uma lâmpada que queimou
um conceito lógico sobre a fofoca
cheiros e temperos
a salvação da humanidade
se um novo mar abriu
-se em óleo
os erros mais comuns da ortografia
se os pássaros aprenderão a fugir
se a ciência chega a tempo
se virão tropas de choque
e colidirão imagens sobre todas as cabeças
o ouro das imagens sobre as cabeças
em um dia comum de pequenos acontecimentos
homens negociam
ideias de enriquecimento
homens como novelos
de uma lã tão tosca
***
Muros gelados
como aqueles que separam almas
muros gelados
na polônia gelada
na pelada gelônia
no meio de auxivitiz
no meio de nothingtrix
no meio do nazix
morto – ?
ora, não nos condene por perceber
***
Não fiz as unhas esta semana
gastei-as
percorrendo teclas eternas
formulando perguntas
serrei-as
clicando em cores
formatando
a métrica
da ideia
da busca
de soluções
montei estruturas sem luxo
anéis de saturno
circulares
paralelos
em eterno movimento
olhei-as buscando a palavra
o sentido exato
risquei a pele
na ânsia por respostas
apoiei-as na língua
entre os dentes
e meu olhar se congelou num ponto
o limite
indignada, cortei uma delas
com uma mordida
***
Refém do primeiro verso
a palavra não encontra mais caminho
verbo
não concretiza mais destino
ponto
não aborda reticências
vírgula
não carrega interjeições
não há sujeito
nem provas que houve
o artigo não define mais nada
ou indefine
metáforas
métricas
rimas
elipses
são só dores fantasma
estrofe perdeu a língua
ninguém cogita resgate
***
A incapacidade de compreender o furacão
quando falta o ar
e a devastação é a respiração da terra
***
Fizeram do poeta uma estátua
parada na orla de uma cidade
que não é Itabira
fizeram do poeta uma pedra
parada numa rua
que não é um caminho
fizeram do poeta um ser calado
como sempre fora
e sozinho
agora repouso metamórfico
metálico
de partículas filosóficas do ar
que o rodeia
ele não ri nem de soslaio
antes odeia
***
Intergentes falais
por códigos análogos
semiólogos espiais
pela espinha e sob o dorso
do dragão
a curvatura de um código-fonte
subdesenvolvido para ser manipulado
num grande laboratório de códigos-fonte
epistemólogos e matemáticos decifrais
se o movimento
qualquer movimento
é concebido a priori
se for
e de fato parece ser,
juristas compadecei-vos
das inúmeras rédeas sem dono
que constam nos autos
e
poetas
afundais
porque já é ávida
e movediça
a lavra da palavra
cuja grafia começou
ontem
Autora do livro 70 poemas, Ana Peluso, 1966, abandonou Letras e Psicologia pelo Desenho Publicitário. Não deu certo. Aos treze anos sonhava ser Alquimista. Aos cinco, Bailarina, Pianista, Pintora. Aos sete, Professora. Costumava reescrever Novelas mentalmente. Livros, jamais. Catalogava Folhas colhidas na Rua. Esculpia Bonecos em borracha, Papel e batata. Imaginava um mundo feito de Palitos de Fósforo. Escrevia Diários. Hoje faz Sites em html1, retrô-total. Sempre foi Pisciana, só Parece que não. O livro 70 poemas integra a Coleção Patuscada, premiada com o ProAC – Programa de Ação Cultural da Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo.
Ana,
Querida,
Senti-me tão presente em teus versos,
tão di-ver-sos,
tão presentes,
presente
recebido.
Presentemente
Lindos!
Fortes
de Ar e Tijolos,
Concretos e
Ethos