Gramofone

Por Wilfredo Lessa Jr.

 

PEARL JAM – GIGATON

 

 

O grunge morreu. De overdose, de velhice, de Boy Band. Ainda assim, permanece imantado a nossa realidade cultural, seja na imagem de Cobain, seja nas playlists de Rock n’ Roll (onde virou clássico, que horror!).  A única banda dessa geração que nunca parou foi o Pearl Jam. Cada vez mais longe dos  seus próprios clássicos (Ten, Versus e Vitalogy)  e mais próxima de New Young, tanto na excelência quanto  no desapego ao passado, em se tratando dos discos. Só por isso eles já merecem palmas.

Gigaton (2020) é um disco que se aproxima muito de Bruce Springsteen fase “Lucky Town” (1992). É um disco de 12 canções em que Eddie Vedder fala sobre tudo (política, machismo etc.) sem abandonar um certo messianismo e aquela autoanálise autoindulgente que pode soar totalmente mala, mas também vale pra boomer se sentir o próprio (quem? eu…?).

Faixa a faixa:

1- Who ever said – se você já ouviu PJ, você já ouviu essa, tem todas as convenções, mudanças melódicas e tals . Traz já de cara uma letra olhando pra dentro. Num mundo de incertezas e inércia, de verdades distorcidas e doloridas, pra que o Rock? Resposta, pra ter “Satisfaction”.

2- Superblood Wolfmoon – essa pra mim deveria abrir o disco, rápida, agressiva e um tanto polêmica. É a faixa “me too” dos caras, onde Eddie não só faz uma autocrítica, mas também manda descer do pedestal. Ele fala de um homem acuado, irritado e culpado, que ainda não sabe como lidar com  a “loba” na lua cheia.

3- Dance of the Clairvoyants – faixa de lançamento, causou uma comoção entre os fãs que acharam muito “eletrônica”, mas a mim veio “Cannonball”, do Breeders,  e  “Ulysses”, do Franz Ferdinand, no refrão. Mais temas de confusão e angústia em relação a uma modernidade que não veio pra resolver, mas pra piorar.

4- Quick Scape – fazia tempo que eu não ouvia uma faixa tão Zeppelin dos caras, seja nas guitarras, na cozinha ou no refrão. A letra,  bem anti-trump, justifica sua “saída rápida” pra arrumar as ideias no meio dessa lama. Sugiro umas cervejinhas ou um chá.

 

Foto: divulgação

 

5- Alright – Essa é tão neo hippie que exala patchouli. Discursinho tirado a U2 tentando mostrar que se importa. Não, obrigado!

6- Seven O’Clock – Bruce Springsteen devia cobrar direitos autorais por essa. Panfletária (Trump escroto!), funciona muito porque o estribilho faz tudo soar sincero.

7- Never Destination – outra das minhas preferidas, direta, reta e energética. Muito legal pensar que uma banda com esse tempo de estrada ainda soa tão crua quando quer.

8- Take the Long Way – tem um riff quebrado muito interessante, me lembra  “Life Wasted” na melodia, desce redondo e não desanima.

9- Bucle Up –  faixa passável, passe pra próxima.

10- Comes then Goes – melhor balada do disco, de longe. Violão de cordas de aço, sempre roqueiros. Influência Country sem soar mala, uma das coisas que o PJ sabe bem.

11- Retrograde – aposto que essa foi encomendada para o vídeo do Partido Democrata, messianismo embalado a vácuo. Boa pra Ioga de manhã cedo. Amanhã eu começo, tá?

12- River Cross – segunda faixa roubada do “Boss”, última do disco, uma súplica por luz em tempos sombrios, não funcionou pra mim, mas talvez vire a sua “música da crise”.  Se cuida. Tamo junto.

O disco funciona, seja pra quem é fã, porque não foge muito do som deles, seja pra quem quer ouvir um disco de rock que trate do estado atual das coisas sem querer lhe dizer o que fazer, mas perguntando por que fazer. Pearl Jam ainda me causa um certo orgulho, boomer nostálgico que sou.

 

 

 

Wilfredo Lessa Jr. é professor de inglês que nunca morou fora, músico que não toca instrumento e intelectual que não se formou. Diz ele. Membro inativo do P3 (projeto 3), Infected Minds e Irmandade Arcana. Também se finge de escritor para poder falar de livro com gente que é.

 

 

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2 Comentários

  1. O Grunge morreu.
    Isso foi pesadamente verdadeiro, otima resenha!

  2. Excelente álbum, texto melhor ainda!!!

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