Alberto Bresciani
CHOICE
Um corpo arrastado
pelo rio
Ainda vivo
esbarrando nas pedras
atravessando a trama
de raízes das margens
Ainda vivo
como se tivesse
guelras
Toca o fundo
Corta os pés o sexo
os joelhos os lábios
Aceita quase o fim
Ouve o chamado
pra voltar
– “entra
tá na hora
já vêm te buscar” –
Vê outra vez
os livros no chão
descrença
brinquedos quebrados
o preto e o branco
Cruz
em cada perda
Então sobe
engole ar arranca ar
Aceita exércitos
invisíveis
palavras de gente distante
curativos nas datas
velhas
Sobe sai da água
tem asas tem forma
tem chave uma porta
E pode
abrir
***
FANTASMA
Dobrar o lençol
acalma
mas não mata
o fantasma
O abstrato
de seu corpo
é composto
de lembranças
Como líquido
infiltrado nas trincas
paredes
Descendo
pelas torneiras
É rio
É mar
: não se apaga
a memória
da água
***
PAZ
Atados
à aridez
de fendas rochosas
cactos respiram
sem receio
seus espinhos
sua flor
***
AVENTURA
Esta é a história
Sim o traçado é sempre
irregular
sobe e cai sem aviso
tudo entre lacunas emboscadas
ou a sorte de um desvio bom
As vozes muitas vezes
são de anjos
(não estranhe desalinho
cabelos revoltos)
Já as unhas outras tantas
de demônios
(atenção a relógios de marca
um certo ingênuo rubor)
Estão todos juntos
sem crachás
na mesma calçada
Assim
muito cuidado
ao escolher o botão
do elevador
O inferno não está mais
só no primeiro
andar
***
DEUS DISFARÇADO
I
Não seremos
os nomes na árvore
Nem as palavras a lápis
na página do livro
O gosto que sobra
é o silêncio
rasgando a garganta
II
É preciso contar
da fuga imensa
pra dentro do corpo
III
Esperamos
Quem nos dê um poema
crença alguma alegria
Como um filho
que nasce
Alberto Bresciani nasceu no Rio de Janeiro e vive em Brasília. Poeta e ficcionista, tem trabalhos publicados em jornais e revistas impressas ou virtuais, em portais e blogues da internet. Publicou “Incompleto movimento”, poesia (José Olympio Editora, 2011). Integra a antologia “Hiperconexões – realidade expandida”, poesia (Editora Patuá, 2014). Escreve em Nóstres e em Zonadapalavra.
Ler e reler Alberto Bresciani é o melhor presente natalino para quem gosta da boa literatura poética.
Alberto Bresciani é poeta denso, sucinto na medida e exato n aconstrução de versos fortes e ao mesmo tempo suaves e sutis. Como “o silêncio que resga a garganta” sua poesia insinua, aponta, provoca e por fim silencia… para surgir mais adiante como um eco que renasce.