Tom Santos
Mar negro
A noite desabou no cais,
engoliu as estrelas
e nuvens cintilavam fogo
contra as ondas.
Tento me ancorar,
viver a finitude dos dias,
erguer faróis incandescentes
e guiar embarcações.
A vida marinha recua
formando verbos
no céu da minha boca
e sigo navegando
sobre o mar
de lágrimas
negras
***
Cais
Na noite acidentada, traço rotas
na tumultuosa viagem
para cantar à cega paixão
………………………………….[ dos dias
entre naufrágios.
Diante do leme, verso notas
perdido no mar
…………………….[ sem mapas
na busca pela face
do Orfeu Negro.
***
Naufrágios
Erguido no silêncio absoluto,
navegando a tempestade
da minha existência,
tenho medo.
Expatriado dos instantes,
contando os minutos,
sem destino
Abandono meu lastro,
e o tempo passa
sobre o escuro
do porto.
***
Dia de chuva
A chuva saliva
tua severidade azul
em paixões úmidas.
Enquanto os peixes
mergulham a face secreta
das palavras
para velejar
seu riso ameno.
***
Gaivotas
Para Jeferson Tenório
As gaivotas desviam
caravelas ao mar
e meu corpo arcado
esqueceu-se a voar
O céu padece
em rochedos pontiagudos
e formações salinas
vão te saudar
no silêncio
Vejo-te bruto a morrer,
enquanto os abutres
rasgaram fendas
na tua carne
revelando amor
ao avesso
da pele.
***
Autorretrato I
O espelho deforma tua imagem
ramificando os horizontes pretos
que contornam sua nudez
tornando-o livre de fronteiras.
Tua face estilhaçou
em mil pedaços
as extremidades
do corpo.
Tom Santos é natural da região metropolitana de Salvador, Bahia. Escritor, ator e graduando em Letras Vernáculas, pela Universidade do Estado da Bahia. É colaborador do coletivo Espaya, e suas apresentações abrangem performances, recitais, monólogos e experimentações artísticas.