Janela Poética III

Tom Santos

 

Ilustração: Viola Sellerino

 

Mar negro

 

A noite desabou no cais,
engoliu as estrelas
e nuvens cintilavam fogo
contra as ondas.

Tento me ancorar,
viver a finitude dos dias,
erguer faróis incandescentes
e guiar embarcações.

A vida marinha recua
formando verbos
no céu da minha boca
e sigo navegando
sobre o mar
de lágrimas
negras

 

 

 

***

 

 

 

Cais

 

Na noite acidentada, traço rotas
na tumultuosa viagem
para cantar à cega paixão
………………………………….[ dos dias
entre naufrágios.

Diante do leme, verso notas
perdido no mar
…………………….[ sem mapas

na busca pela face
do Orfeu Negro.

 

 

 

***

 

 

 

Naufrágios

 

Erguido no silêncio absoluto,
navegando a tempestade
da minha existência,
tenho medo.

Expatriado dos instantes,
contando os minutos,
sem destino

Abandono meu lastro,
e o tempo passa
sobre o escuro
do porto.

 

 

 

***

 

 

 

Dia de chuva

 

A chuva saliva
tua severidade azul
em paixões úmidas.

Enquanto os peixes
mergulham a face secreta
das palavras
para velejar
seu riso ameno.

 

 

 

***

 

 

 

Gaivotas

Para Jeferson Tenório

 

As gaivotas desviam
caravelas ao mar
e meu corpo arcado
esqueceu-se a voar

O céu padece
em rochedos pontiagudos
e formações salinas
vão te saudar
no silêncio

Vejo-te bruto a morrer,
enquanto os abutres
rasgaram fendas
na tua carne
revelando amor
ao avesso
da pele.

 

 

 

***

 

 

 

Autorretrato I

 

O espelho deforma tua imagem
ramificando os horizontes pretos
que contornam sua nudez
tornando-o livre de fronteiras.

Tua face estilhaçou
em mil pedaços
as extremidades
do corpo.

 

Tom Santos é natural da região metropolitana de Salvador, Bahia. Escritor, ator e graduando em Letras Vernáculas, pela Universidade do Estado da Bahia. É colaborador do coletivo Espaya,  e suas apresentações abrangem performances, recitais, monólogos e experimentações artísticas.

 

 

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